A medicalização do corpo de mulher e a violência obstétrica

Paula Land Curi, Júlia Gonçalves Barreto Baptista

Resumo


O contexto da maternidade pública, campo onde nos fixamos para exercer uma prática profissional em psicologia, nos levou a interrogações sobre a violência obstétrica. Logo, objetivamos, com este trabalho, tecer considerações sobre este fenômeno. Para isso, fazemos uma leitura deste a partir da discussão sobre a medicalização do corpo feminino, sem nos deter nas discussões provenientes dos atendimentos clínicos realizados com as usuárias dos dispositivos. Aspiramos articular a violência obstétrica a dois outros tipos de violências contra a mulher: a violência institucional e de gênero. Circunscreveremos como a instituição obstetrícia, surgida no século XIX, sob a égide do discurso científico, se constituiu enquanto saber disciplinador dos corpos das mulheres, legitimando práticas violentas, atualmente nomeadas de violência obstétrica. Intentamos elucidar como esta discussão se articula às mudanças conquistadas referentes aos direitos sexuais e reprodutivos, nacional e internacionalmente, e mostrar como os psicólogos têm o compromisso ético de se colocar neste debate.


Palavras-chave


medicalização do corpo da mulher; violência institucional; violência de gênero.

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